sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013


um rabisco
eu de encontro com a cidade
outro rabisco e já sou cidade, concreto
concreto seria pertencer a Brasília
mas seria ela eu?
uma garatuja, um reflexo de mim habitando minha cidade
minha cartografia, minha casa
meus case 30 anos de cidade
meu corpo marcado por ela
cheio dela estou, até seus contornos vazios
seus espaços vazios 
um puro deleite, ela me dança
me distância, me envolve
me contradiz-es
me tudo, me instante, me dança, me grita, me sufoca
me angústia, me alegra, me toca
me projeta, me transpassa
me é cidade
me é corpo. 

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013


Foi numa cabeça vazia de Outubro que Janeiro descobriu um tumor no pâncreas. O jardineiro disse: “é benigno, mas faz mal”. Três dias passaram voando e pousaram no sensual peitoril de uma janela, que, muito simpática como era, se fechou logo num estrondo que trincou os brindes de ano novo no andar abaixo. 
Com uma concha marinha, colocou três medidas de rio nos pensamentos, o suficiente para avaliar se o crânio estaria meio cheio ou meio vazio. Se estivesse meio cheio, seria benigno como a Teresa na Madre; se estivesse meio vazio, seria benigno como a Teresa no Calcutá.
Escoou os pancreamentos em uma chuva de Fevereiro, que caiu sobre um bloco triste de carnaval, cheio de serpentinas peçonhentas e mendicantes de golinhos gelados da Antártica.
Ah! Se ao menos não tivesse anoitecido ontem! Ou se tivéssemos pulado das 18h25min direto pros primeiros versos, pros primeiros sentidos, pro pelotão sentindo, pro peladão certinho, pro meu medinho, pra mim aconchegado no seu mindinho... se tivéssemos pulado da Torre de TV!
E essa dor no meu athos bulcão... não sei que quadrilátero é esse, só sei que é terminal, de onde Sobradinho está a apenas R$ 3,00 de distância. É looooooooooonge! Longe como os fartos peitoris da janela, amamentando de vento uma parede imensa. E se a janela fosse um mês, seria Abril. Não tenho certeza.
Vou ficar uns três metros afastado pra poder envelhecer. Enquanto isso, assistir ao jardineiro trabalhar e esperar aquela garoa aguar seus diagnósticos. É benigno deixar o espaço passar assim, cheio de graça a caminho do centro dos olhos da anatomia de quase qualquer um.
É tudo uma questão de perspectiva: se está ótimo, é otimismo; se está péssimo, é melhor cantar uma música pra espantar os mares e ignorar as marés. Afinal de contas ninguém fica oco, o que acontece é gente inspirando tão fundo que se enche de ar e só. O resto de nós fica aqui respirando com dificuldade esse tanto de órgãos, ossos, sangue e ideias despejados... As pessoas não-ocas vão nos matar asfixiados! Estou cuidando pra não inspirar muito fundo... EITA! Olha que passaram voando mais dois dias! É hora de ir chegando em qualquer lugar à frente.
Mas eu estou esperando a carona: semana que vem é carnaval. 
As más notícias são que afinal Janeiro morreu. O maligno jardineiro riu.